“Eu sou fiel à Rainha do Nilo até meu último
cílio. Prometo que nem em pensamento desgrudo dela. Cuido de massagear,
maquiar, pentear, vestir, distrair e divertir Cleópatra". A devoção
desmedida de Crodoaldo (Marcelo Serrado) por Tereza Cristina (Christiane
Torloni) vem intrigando quem acompanha "Fina estampa", na mesma
medida em que o jeitinho afetado e o look transadérrimo do mordomo lhe arranca
risadas. Em apenas três semanas de novela, o "personal all"
(faz-tudo) da dondoca já mostrou a que veio: é um dos grandes destaques da
trama de Aguinaldo Silva.
— No dia seguinte à estreia, já via gente
acenando para mim de dentro do ônibus, senhoras aplaudindo no restaurante... E
os câmeras, que não paravam de rir durante as gravações? Foram meu primeiro
termômetro. De cara, percebi que o personagem é mesmo muito popular! — conta
Serrado, desta vez o único ator a interpretar um homossexual assumido no
horário nobre da Globo: — "Insensato coração" teve uma porção, talvez
por isso tenha cansado um pouco. Mas é aquilo: cada um no seu quadrado. O nosso
gay é leve, divertido, solar... Crô é uma bichinha reprimida. E Aguinaldo quis
um ator hétero para dar vida a ele. Pois não tenho problema algum com a minha
masculinidade, em dar pinta. Radicalizei mesmo!
Radicalizou, mas com o cuidado de não cair no
caricato:
— Tenho a preocupação de sempre baixar a bola
em cena. Crô já tem uma roupa chamativa, um cabelo nada convencional, usa as
expressões mais bizarras para se referir à patroa (Rainha do Nilo, Filha de
Osíris, Divina Ísis, Pitonisa de Tebas, Sereia da Núbia e Nefertiti são algumas
delas)... Imagina se eu ainda fizesse uma interpretação escandalosa? Viraria um
carnaval! Por enquanto, só tenho recebido elogios. É ótimo andar pelo Projac e
receber cumprimentos do diretor do mais alto escalão ao funcionário da limpeza.
Só me faz pensar que estou indo pelo caminho certo. Meus vários amigos gays
também aprovaram.
Marcelo Serrado caracterizado como Crô:
óculos coloridos e roupitcha transada Marcelo Serrado caracterizado como Crô:
óculos coloridos e roupitcha transada Foto: Divulgação/ TV Globo
Para a composição de Crô, antes mesmo de
definido o figurino ("Quando boto aquela bermudinha ou a calça apertada, a
voz e os trejeitos vêm com tudo"), Serrado assistiu a diversos desfiles de
moda ("Ele é fashionista, eu faço o estilo blazer-camiseta-calça
jeans-tênis") e começou a frequentar boates LGBT. Em alguns momentos,
conta, passou por saias-justas:
— Na Danger, em São Paulo, teve um cara que
me parou: "Marcelo Serrado, você por aqui?!". Tentei dizer que eu não
era gay, que só estava ali a trabalho, mas ele não deu chance: "Não precisa
explicar nada! Agora fiquei ainda mais seu fã!". E na 00, aqui no Rio, uma
menina me abordou: "Pô, você é lindo! Posso te dar um beijo?". Nisso,
surge o Sergio Penna, preparador de elenco que tem me acompanhado nesses
lugares, e diz: "Ele não pode agora". A garota, que nem era carioca,
deve ter voltado para a terra dela com a certeza de que eu não gostava de
mulher (risos).
Aos 44 anos, o ator — que não confirma nem
nega a solteirice — acabou por fazer uma descoberta que muito parece lhe ter
interessado:
— As mulheres mais lindas frequentam esse
tipo de boate. Elas adoram se divertir, dançar com os amigos gays! Quem sabe,
por causa do Crô, eu também faça mais sucesso com a ala feminina?
O jeitinho fofo e querido de Crodoaldo, no
entanto, pode mascarar um caráter duvidoso...
— Ninguém é uma coisa só, completamente bom
ou mau. Crô é tão devoto de Tereza Cristina, tem tanta gratidão por ela ter
bancado seus estudos e o acolhido, que é capaz de tudo, até de sujar as
próprias mãos para vê-la satisfeita. Acho que ele é um pouco vilão, sim, e que
pode se revelar. Quem sabe ele não passe para o lado de Griselda (Lilia Cabral)
mais para a frente? — sugestiona Serrado, lembrando, ainda, do caso secreto que
seu personagem mantém com um misterioso machão de escorpião tatuado no
calcanhar: — Já gravei cenas com três atores diferentes. Especula-se que seja
um dos frequentadores da rede de vôlei da praia, mas novos personagens vão
surgir na trama... Aguinaldo pode estar dando pista falsa.
Diante de um universo tão rico de
possibilidades, Marcelo Serrado é só sorrisos, claro. De volta ao casting
global, depois de cinco anos integrando o primeiro time de atores da TV Record,
ele comemora o que gosta de chamar de seu "primeiro protagonista na
Globo":
— Sinceramente, se eu não tivesse me
arriscado fora, nunca ganharia um papel com essa força, com essa importância na
Globo. Por isso, tenho muito a agradecer à Record. O Crô só está sendo possível
porque o Delegado Nogueira, de "Vidas opostas" (2006), e o Bruno
Vilar, de "Poder paralelo" (2009), constam no meu currículo
profissional. Além de o meu trabalho ter ganhado projeção aos olhos dos outros,
pude provar para mim mesmo que posso ir a lugares radicais, ousar.
Diferentemente de Gabriel Braga Nunes, que
regressou baseado num contrato por obra e, só depois do estouro em
"Insensato coração", renovou com a emissora sob o status de astro de
primeira grandeza, Serrado já tem garantidos, ao menos, três anos na Globo.
— Foi bom ele ter vindo antes, aberto as
portas de forma tão bonita. Fiquei muito feliz com o sucesso do Gabriel, é um
cara que merece. Estou na mesma expectativa, sem grandes ansiedades — afirma,
completando: — Acho que há poucos bons atores na nossa faixa etária, dos 40. E,
para mim, ser bom ator é ralar, estudar, se dedicar. Não existe essa de
"acordei, fui lá e fiz". Não vai baixar um santo, do nada.
Sem propriamente considerar-se um galã
("Tenho lá o meu charme, o meu borogodó"), Serrado sabe do fascínio
que exerce no público feminino. Interessado em mulheres "sinceras e um
pouco loucas, porque as certinhas não são tão atraentes", tenta colocar a
vida pessoal nos eixos, para impulsionar ainda mais a profissional (ele tem
sido visto em companhia constante de uma loura, a bailarina Roberta Fernandes).
— Quando você está com alguém, fica mais
tranquilo, focado no trabalho. A vida de solteiro me deixa um pouco disperso.
Tenho o sonho de casar na igreja, ter mais filhos (ele é pai de Catarina, de 6
anos, fruto de sua relação com a atriz Rafaela Mandelli). Pronto, está aí o meu
ponto em comum com o Crô: sou bem romântico, não?
Fonte: Jornal Extra
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