Há exatos quarenta anos a Globo lançava uma
das novelas de maior sucesso da TV brasileira: Selva de Pedra, escrita por
Janete Clair, com direção de Reynaldo Boury e Daniel Filho – substituído depois
por Walter Avancini, então estreando na Globo.
Selva de Pedra foi a quarta de uma série de
novelas consecutivas que Janete escreveu para o horário das oito da Globo.
Entre novembro de 1969 e janeiro de 1973, a autora escreveu, ininterruptamente:
Véu de Noiva, Irmãos Coragem (sendo esta uma das mais longas novelas da
emissora), O Homem que Deve Morrer e Selva de Pedra.
A novela foi baseada no romance “Uma Tragédia
Americana”, de Theodore Dreiser, que já havia rendido dois filmes em Hollywood:
o primeiro, em 1931, de Joseph Von Sternberg, com o mesmo título do romance
original, com Sylvia Sidney, Philips Holmes e Frances Dee. E o segundo, o filme
“Um Lugar ao Sol”, em 1951, de George Stevens, com Shelley Winters, Montgomery
Clift e Elizabeth Taylor.
Na TV, o triângulo amoroso central foi vivido
por Regina Duarte (Simone), Francisco Cuoco (Cristiano) e Dina Sfat (Fernanda,
numa interpretação marcante). Outro ator que brilhou no elenco foi Carlos
Vereza, que deu vida ao malandro Miro, um tipo de caráter duvidoso, mas
extremamente carismático, que caiu no gosto do público.
O ponto de partida é o mesmo da história
original: rapaz pobre (Cristiano) se casa com moça pobre (Simone), mas conhece
moça rica (Fernanda) e fica dividido entre as duas, pensando na possibilidade
de matar a jovem pobre para viabilizar seu casamento com a rica. Mas a censura
do Regime Militar da época obrigou a autora a mudar seu roteiro: o mocinho não
poderia se casar com a rica porque já era casado com a pobre – mesmo ele
pensando que a pobre estivesse morta. Janete Clair teve que inutilizar 22
capítulos e várias cenas foram regravadas.
Na história, Miro convencia Cristiano de que,
para ele se casar com Fernanda, era preciso se livrar de Simone. Miro se
encarregou do serviço e, numa perseguição, o carro de Simone caiu num
precipício – uma das sequências mais marcantes da novela. Cristiano, em crise de
consciência, não conseguiu se casar com Fernanda, abandonando-a no altar.
Mas Simone sobreviveu. Ela preferiu que todos
continuassem achando que estava morta e partiu para o exterior com outra
identidade, Rosana. Em seu retorno ao Brasil, Cristiano não acreditou na farsa
e tentou se reaproximar da ex-mulher, que se tornara uma artista plástica
famosa. Enquanto isso, Fernanda, enlouquecida, fazia de tudo para destruir seus
desafetos, Cristiano e Simone.
A mudança de rumos acabou gerando novos
desfechos para Selva de Pedra, que fez com o público ficasse cada vez mais
vidrado na trama. O capítulo 152, apresentado em 04/10/1972, registrou
incríveis 100% de audiência no Ibope, pelo menos nas cidades de São Paulo e Rio
de Janeiro. Foi o capítulo em que Rosana,
ou melhor, Simone, era desmascarada por Cristiano, na polícia.
Selva de Pedra foi reprisada em 1975, em
forma compacta, também às oito da noite, cobrindo a censura de Roque Santeiro,
que havia sido impedida de ir ao ar em sua estreia. Enquanto a Globo
providenciava uma novela substituta (Pecado Capital), a emissora optou por
reprisar Selva de Pedra, que, mesmo fresquinha na memória dos telespectadores,
voltou a fazer sucesso. Em 1986 foi ao ar o remake da novela, com Fernanda
Torres (Simone), Tony Ramos (Cristiano), Christiane Torloni (Fernanda) e Miguel
Falabella (Miro).
Selva de Pedra é uma representante da era da
inocência da televisão brasileira, em que o talento de seus profissionais se
contrapunha aos parcos recursos técnicos da época e a um público muito
diferente do de hoje em dia. Sob a vigilância do governo do Regime Militar, a
TV evitava a dura realidade através de uma história extremamente sedutora e
envolvente – como bem citou Ismael Fernandes em seu livro “Memória da
Telenovela Brasileira”:
“O país vivia a fase do “milagre brasileiro”
e com prazer se reunia à frente da televisão para assistir a vitória do bem
sobre o mal, como mostrou o último capítulo. Acontecia um milagre na vida de
Cristiano e Simone. Eles voltavam a se entender como nos duros tempos, mas não
eram mais os mesmos. Agora eles se amavam envolvidos pelo dinheiro ao sabor do
sucesso pessoal. Era o milagre brasileiro mesmo!”
Para finalizar, a música Rock and Roll
Lullaby, gravada por B. J. Thomas, embalou o romance do casal protagonista e
virou um fenômeno nas rádios, tornando-se um dos temas musicais mais marcantes
de nossa TV.
Fonte: Nilson Xavier, do UOL
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