A Rede Manchete, canal de propriedade do empresário
Adolpho Bloch, estaria completando 30 anos de atividade nesta quarta-feira (05)
caso ainda estivesse no ar.
A emissora, que estreou no dia 5 de junho de
1983, foi encerrada em 10 de maio de 1999 após uma sucessão de erros de
planejamento, os quais acarretaram em milionárias e impagáveis dívidas.
Salários atrasados, investimentos mal sucedidos, aliados à queda drástica de
audiência e a fuga de profissionais renomados para canais com maior
estabilidade, como a Globo, Record e SBT, culminaram no encerramento de suas
atividades menos de 20 anos após sua inauguração.
História:
A Rede Manchete entrou na casa dos
brasileiros em um domingo. Neste dia, foi ao ar uma contagem regressiva e na
sequência um discurso de Adolpho Bloch. Com um pacote gráfico futurístico e
inovador, a Manchete prometia revolucionar a televisão brasileira.
O
imponente prédio da Manchete no Rio de Janeiro; o edifício foi totalmente reformado
e agora é ocupado por empresa de investimentos
O primeiro programa veiculado foi o
"Mundo Mágico", show com participação de diversos conjuntos musicais.
Ainda na noite de estreia, foi exibido o filme "Contatos Imediatos do
Terceiro Grau", de Steven Spielberg, que impôs a primeira grande e amarga
derrota à Globo no Rio por um placar de 27 a 12 pontos.
Dramaturgia:
A Rede Manchete apostou em uma dramaturgia
inovadora e diferente da que a Globo levava ao ar. A emissora investiu na
contratação de nomes em ascensão no canal carioca, como a autora Glória Perez,
o diretor Jayme Monjardim, os atores Lucélia Santos e Maytê Proença, e outros
de grande prestígio, como os roteiristas Benedito Ruy Barbosa e Manoel Carlos.
Maytê
Proença protagonizou a “Marquesa de Santos” e “Dona Beija”, novela esta que foi
um marco na dramaturgia da Manchete, pois foi a primeira vez em anos que uma
novela da concorrência derrotava uma novela global no ibope: 42 a 41 pontos de média.
A Manchete emplacou novelas de bons
resultados, como "Dona Beija", "Corpo Santo",
"Carmem", "Kananga do Japão", "A História de Ana Raio
e Zé Trovão", "Mandacaru" e "Xica da Silva" e
"Pantanal", de Benedito Ruy Barbosa e de direção de Jayme Monjardim.
"Pantanal" chegou a ser apresentada
à Globo anos antes de Benedito assinar com a Manchete, mas acabou preterida
pela direção da emissora. Entre as supostas alegações estavam o alto custo que
seria deslocar uma equipe de gravação para um local tão distante e desprovido
de estrutura, como o pantanal mato-grossense.
Benedito
Ruy Barbosa: autor volta à Globo após fenômeno de "Pantanal" em
grande
estilo e é chamado pela imprensa de "O Mago das Novelas"
O sucesso da novela foi tamanho que Benedito
Ruy Barbosa, então autor de novelas das 18h da Globo, como "Paraíso"
e "Meu Pedacinho de Chão", voltou à emissora em alta e emplacou
"Renascer" no horário das 21h. O diretor Jayme Monjardim também fez o
mesmo caminho de volta.
Já a Manchete tentou repetir o sucesso com
"Amazônia". Duas cidades cenográficas chegaram a ser erguidas e,
embora não contasse mais com o texto de um autor como Benedito e da segura
direção de Monjardim, houve compensações por meio de um alto orçamento e um
time de atores em ascensão, como Marcos Palmeira, Cristiana Oliveira e Julia
Lemmertz, alternados com outros de maior bagagem, como José de Abreu, José
Dumont, Leonardo Villar, Antonio Petrim, Antonio Abujamra e Jussara Freire. A
aposta não deu certo e, ainda que com várias mudanças em seu texto, nem de
longe o Ibope alcançado se parecia com o de "Pantanal".
A Manchete sofreu uma série de baixas ao
longo dos anos 90. O sucesso de "Pantanal", aliado ao bom desempenho
de atores e diretores, chamou a atenção da Globo, que trouxe de volta vários
nomes e contratou outros da concorrente. Além da dupla Benedito e Jayme
Monjardim, também voltaram à Globo Glória Perez, José Wilker, Luiz Fernando de
Carvalho, Maytê Proença, entre outros.
Taís
Araújo em "Xica da Silva": Manchete volta a ter bons momentos na
dramaturgia
com
obra de Adamo Angel, pseudônimo de Walcyr Carrasco
As apostas então passaram a ser em nomes
menos consagrados tanto atrás das câmeras como na frente. "Xica da
Silva", um dos últimos sucessos da rede, teve a autoria de Walcyr
Carrasco, cuja carreira como autor de novelas estava começando. Walcyr assinou
a novela como Adamo Angel.
Taís Araújo, Victor Wagner e Drica Moraes,
todos com poucas ou pequenas participações na dramaturgia, ocuparam os papéis
principais. De alto escalão, havia sobrado apenas o diretor Walter Avancini, um
dos maiores defensores da existência de um núcleo de dramaturgia alternativo ao
da Globo.
Artístico:
A Manchete apostou bastante em sua linha de
shows e em programas do departamento artístico. Raul Gil, por exemplo, tinha um
programa de auditório nos moldes do que apresentou posteriormente na Record,
Band e hoje em dia no SBT.
Angélica,
que comandava o "Angélica Milk Shake", foi um dos nomes projetados pela
Manchete e que hoje é uma das principais apresentadoras da Globo após passagem
pelo SBT
Foi na emissora carioca que Angélica começou
sua carreira e se consagrou. Entretanto, como a maioria dos nomes em ascensão,
acabou sendo seduzida por canais com maior visibilidade, e assinou com o SBT e
depois migrou para a Globo, onde está até hoje. A menina Debby Lagranha foi
outra que começou no canal e depois se transferiu para a concorrente.
A programação infantil nunca foi deixada de
lado e a rede foi uma das poucas a investir em animes japoneses e em séries
como "Cavaleiros do Zodíaco", "Jaspion", Sailor Moon",
entre outros.
Jornalismo:
Com grande foco na política, economia e
diferenciando-se por não ceder à apelação policial, a Manchete teve um
jornalismo de bastante prestígio.
O departamento projetou nomes que até hoje
estão no ar, como Mylena Ciribelli, Claudia Barthel, Alexandre Garcia e Carlos
Chagas. O "Jornal da Manchete", em determinadas épocas, chegou a
ficar no ar por cerca de três horas e, em outras, chegou a ter uma edição
vespertina.
Coberturas, como a do Carnaval do Rio de
Janeiro, que hoje são de alto valor comercial, devem parte de sua valorização à
Manchete, que sempre apostou pesado nos desfiles. Outros eventos esportivos,
como a Copa do Mundo, também tiveram atenção especial por parte do núcleo de
jornalismo.
Decadência:
Os primeiros sinais de decadência da Manchete
foram perceptíveis em 1998. "Mandacaru", na época em cartaz, apesar
de bons números, exigia altos investimentos e não tinha um bom retorno comercial.
Os noticiários e a linha de shows também já não vinham com o mesmo apelo de
antigamente.
Pôster
de "Brida", novela protagonizada por Carolina Kasting: alto
investimento e direção
de
Walter Avancini não são suficientes para agradar telespectador; folhetim é
encerrado com
pouco mais
de 50 capítulos após greve.
Na dramaturgia, foi dada a última cartada com
"Brida", romance inspirado no original de Paulo Coelho. Não foram
poupados investimentos, afinal acreditava-se que a produção seria responsável
por reerguer a dramaturgia e consequentemente o canal.
A aposta foi em vão. "Brida" tinha
patrocinadores garantidos caso alcançasse ao menos 5 pontos de Ibope - embora
as expectativas fossem muito maiores. Com os números abaixo do prometido, o
mercado publicitário abandonou a trama, que passou por uma série de alterações.
Cenas eróticas foram inseridas mas não houve reação.
Nem mesmo a direção de Walter Avancini, um
dos mais renomados diretores do Brasil, foi suficiente para tornar a trama um
sucesso. A exibição, que deveria ultrapassar a casa dos 150 capítulos, foi
abreviada para 54 e o desfecho dos atores foi ao ar em narração em decorrência
das greves que impossibilitavam a continuação das gravações.
A maior parte das afiliadas migrou para a
Band, Record e SBT e a gestão dos herdeiros de Adolpho Bloch, falecido no fim
de 1995, após um certo êxito no começo, começou a desandar. Até mesmo uma
parceria com uma igreja evangélica chegou a vigorar mas foi desfeita meses
mais tarde.
RedeTV!:
A Manchete foi adquirida pelo empresário
Amílcare Dallevo. Ele, na época, explorava os serviços de 0900, utilizados para
a concessão ou sorteio de prêmios ou televendas. Assim, surgiu a RedeTV!.
RedeTV!
e sua primeira sede, na cidade de Barueri
Apesar do encerramento oficial da Manchete,
reflexos da emissora se estendem até os dias de hoje. Dívidas trabalhistas não
reconhecidas pela RedeTV! e outras ações na Justiça vieram se desenrolando
durante os anos 2000 e muitos trabalhadores seguem sem receber, ainda que
Dallevo tivesse prometido honrar as dívidas com os funcionários da Manchete
atendendo a uma exigência do Ministério das Comunicações.
A RedeTV! chegou a manter alguns nomes da
Manchete, como Claudia Barthel e Denise Campos de Toledo. Entretanto, em nenhum
momento dos seus mais de 13 anos de história, o canal chegou a ter estrutura
similar à da antecessora. Até hoje, a RedeTV! jamais veio a produzir uma novela
sequer e seu núcleo artístico, de jornalismo e de esportes é bem mais enxuto se
comparado ao da empresa da família Bloch.
Atualmente o nome "Manchete"
pertence à TV Pampa, afiliada da RedeTV! no Rio Grande do Sul. Desde o fim da
Manchete, rumores surgem com frequência sugerindo uma retomada da emissora ou o
reaproveitamento do nome de alguma forma, o que nunca aconteceu.
As únicas lembranças da Manchete junto aos
telespectadores e antigos colaboradores pode ser percebida ao longo destes
últimos anos, com a aquisição de parte de seu acervo de dramaturgia pelas suas
antigas concorrentes.
O SBT reprisou "Xica da Silva",
"Pantanal", "Dona Beija" e "Ana Raio e Zé
Trovão". Já a Band transmitiu - e com êxito - "Mandacaru".
"Pantanal" chegou a bater a inédita "Chamas da Vida" da
Record, enquanto as outras tiveram índices menores, mas ainda assim
satisfatórios levando em conta o baixíssimo investimento feito e o retorno
conquistado.
Fonte: Na Telinha
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